Frases
de Amor, por William Shakespeare
Poemas
e Frases de Fernando Pessoa
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Dia de Natal
Hoje é dia de
ser bom.
É dia de passar a mão pelo rosto das
crianças,
de falar e de ouvir com mavioso tom,
de abraçar toda a gente e de
oferecer lembranças.
É dia de pensar nos outros—
coitadinhos— nos que padecem,
de lhes darmos coragem para poderem
continuar a aceitar a sua miséria,
de perdoar aos nossos inimigos,
mesmo aos que não merecem,
de meditar sobre a nossa existência,
tão efémera e tão séria.
Comove tanta fraternidade universal.
É só abrir o rádio e logo um coro de
anjos,
como se de anjos fosse,
numa toada doce,
de violas e banjos,
Entoa gravemente um hino ao Criador.
E mal se extinguem os clamores
plangentes,
a voz do locutor
anuncia o melhor dos detergentes.
De novo a melopeia inunda a Terra e
o Céu
e as vozes crescem num fervor
patético.
(Vossa Excelência verificou a hora
exacta em que o Menino Jesus nasceu?
Não seja estúpido! Compre
imediatamente um relógio de pulso
antimagnético.)
Torna-se difícil caminhar nas
preciosas ruas.
Toda a gente se acotovela, se
multiplica em gestos, esfuziante.
Todos participam nas alegrias dos
outros como se fossem suas
e fazem adeuses enluvados aos bons
amigos que passam mais distante.
Nas lojas, na luxúria das montras e
dos escaparates,
com subtis requintes de bom gosto e
de engenhosa dinâmica,
cintilam, sob o intenso fluxo de
milhares de quilovates,
as belas coisas inúteis de plástico,
de metal, de vidro e de cerâmica.
Os olhos acorrem, num alvoroço
liquefeito,
ao chamamento voluptuoso dos brilhos
e das cores.
É como se tudo aquilo nos dissesse
directamente respeito,
como se o Céu olhasse para nós e nos
cobrisse de bênçãos e favores.
A Oratória de Bach embruxa a
atmosfera do arruamento.
Adivinha-se uma roupagem diáfana a
desembrulhar-se no ar.
E a gente, mesmo sem querer, entra
no estabelecimento
e compra— louvado seja o Senhor!— o
que nunca tinha pensado comprado.
Mas a maior felicidade é a da gente
pequena.
Naquela véspera santa
a sua comoção é tanta, tanta, tanta,
que nem dorme serena.
Cada menino
abre um olhinho
na noite incerta
para ver se a aurora
já está desperta.
De manhãzinha,
salta da cama,
corre à cozinha
mesmo em pijama.
Ah!!!!!!!!!!
Na branda macieza
da matutina luz
aguarda-o a surpresa
do Menino Jesus.
Jesus
o doce Jesus,
o mesmo que nasceu na manjedoura,
veio pôr no sapatinho
do Pedrinho
uma metralhadora.
Que alegria
reinou naquela casa em todo o santo
dia!
O Pedrinho, estrategicamente
escondido atrás das portas,
fuzilava tudo com devastadoras
rajadas
e obrigava as criadas
a caírem no chão como se fossem
mortas:
Tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá.
Já está!
E fazia-as erguer para de novo
matá-las.
E até mesmo a mamã e o sisudo papá
fingiam
que caíam
crivados de balas.
Dia de Confraternização Universal,
Dia de Amor, de Paz, de Felicidade,
de Sonhos e Venturas.
É dia de Natal.
Paz na Terra aos Homens de Boa
Vontade.
Glória a Deus nas Alturas.
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