PressagoO
presságio aí está, negro presságio.
A falar-me, silente, de dores por doer
Mais doídas que todas as dores já doídas.
A dor, talvez, de nunca mais doer.
Não são dores da carne. Não só.
Nem serão dores maiores, estertórias.
São dores da alma minha, balindo, trêmula.
Dores que, antes de doer, já me doem aqui, agora.
Que resta nesta vida por doer-me?
Já não doí minhas dores todas?
E a roda da dor, acaso, pára um dia?
Em que homem vivo, cansada, ela parou?
Esse temor pressago que me assalta
É o de perder o último, derradeiro, bem que tenho.
A vida aninhada no meu corpo.
Com o prodígio de gozar e de sofrer.
Que é o que temo, eu que nada temo?
A solidão, talvez, de uma eternidade fútil, inútil?
Qual! O que me arrasa é o terror pânico
De não mais ser, nem estar, jamais aí.
Vocês todos vivendo, seus f.d.p., só eu não.
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Aquela
Minha amada é de carne,
de pele e pêlo.
Ora é negra, ora é loura, ora é vermelha.
Minha amada é três. É trinta e três.
Minha amada é lisa, é crespa, é salgada, é doce.
Ela é flor, é fruto, é folha, é tronco.
Também é pão, é sal e manga-rosa.
Minha amada é cidade de ruas e pontes.
É jardim de arrancar flores pelo talo.
Ela é boazuda e é bela como uma fera.
Minha amada é lúbrica, é casta, é catinguenta.
Minha amada tem bocas e bocas de sorver,
de sugar, de espremer, de comer.
Minha amada é funda, latifúndia.
Minha amada é ela, aquela que não vem.
Ainda não veio, nunca veio, ainda não.
Mas virá, ora se virá. A diaba me virá.
Darcy Ribeiro
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